Capítulo I (Um sentimento explicado por trezentas sensações)
VIDA HUMANA
O silêncio é o resto da poesia.
Se for possível.
Ler alergias em peles e teus coçados.
O silêncio é a poesia.
E o não-coçar
subindo em súplica,
a unha.
Febres que termômetro nenhum
sente.
O que não lemos.
O anoitecer.
Eu tenho lábios tímidos
e abri-los lentos é o que sinto.
Lágrimas. E cede, salivada, delas.
E mal começam a molhar a pele,
meu dedo, antes da boca, as bebe.
O seco, o engolir da saliva. É minha vida.
O beijo no travesseiro.
A mordida é meu ensejo.
O recíproco que finjo.
Por um momento é o que sinto.
A ereção
com sonhos que não recordo.
É como te quero, impreciso.
Se nego lembrar-te,
é o sentí-lo…
silêncio…
os…
No susto de mim.
A vontade de você me…
Fogo.
O fio de cabelo na boca,
perdido.
Roçando,
arrepios,
a pele,
num coce
evitando
o cessar
desse frio.
O vento que infla o meu físico,
pela blusa de malha.
Um ninho vazio.
Ali eu vejo
que o amor foi criado por aves
e…
nesses três pontinhos,
meu hino.
Tenho o ronco do estômago, a insaciação,
ruída.
Você…
Quando a ventania,
na rua
sombria
faz redemoinhos
e fascina.
Um silêncio em partituras,
à mão direita.
A respiração ofegante,
a mão direita,
a mão,
o lance,
a voz e o silêncio.
O cheiro
do tempero,
na panela ainda. Insípido.
Aquilo que perco.
A saudade, o teu cheiro que se desfaz.
Na contração do semblante, eu te amo.
Eu criança no balanço, eu te amo.
Eu te.
A dança desse ano.
A temperança que sinto por dentro.
O piano.
O beijo e o pescoço namorando.
Eu te silêncio.
.
Eu te.
O nome que não sei dizer:
o céu frio
pronto pra escorrer bem leve
o que eu te anuncio. …
Gotas de raspão e outras poucas
gotas perdidas.
E liquido te transparecer.
A voz tocar e enlouquecer o tímpano
e gravar um álbum de suspiro e prece serena
e riso.
Tê-lo no meu ouvido é o que digo.
Eu te pronuncio.
Eu te silêncio em minhas notas.
.
Sei do meu sentimento.
Eu sinto ter certezas.
Mas como vivê-lo ainda não sei.
Se finjo,
ou se busco exercer a vida (exercer!)
segundo a minha verdade descoberta
e mentiras ainda misteriosas.
Quero fazer de mim a minha obra.
Capítulo 2 (A hora de levantar e saber cair. E viver)
O SONO DAS TULIPAS
Por quem vive, Tulipa?
Senão tarde, vive
por santos,
sonhos e promessas de rosas?
Viva agora.
Devia era viver agudo, cortante,
a carne
santificada e rude antes tarde
do que nuvens.
A vida é
: a terra, e aquilo que enterra, os fins,
a terra prometida e a realidade
com olheiras à margem da idade.
Devias, acordada, a vida insistir.
: no sono superado, no sonho não acometido.
Sono desejando-se tão limpo, tão mais
que o impossível grunhindo já na vitória, já história.
Viver devias à vida.
: o visto de olhos-ganchos, apreendendo a vida.
O real mais incomensurável.
A vida desmedidamente vida, risos,
antes da sonâmbula prece, sorrisos
bem terrestres.
Encerra-te das roucas finalidades. Vela
o inútil, (é implícito o fruto, pega! A maça é vermelha
e combina com a tua mordida. Reza apenas
pra tentação ser provada, não lida nas linhas
condenadas da vossa bíblia.)
Erra.
Vela o gatilho
do presidente, o risco (pela raiz)
da guerra ao ranger dos vossos dentes,
encerra.
Porque quando a Tulipa acorda,
Elisa, temos a ti.
Nunca à espreita da vida,
ela que avança e cobre sempre tuas esperanças,
de fé.
A vida não é literatura.
Não mergulha em capítulos.
É. Infinito nomeado Ser.
Um prefácil sempre difícil,
de assinaturas renováveis.
A vida é viver maior que o livro.
Pra que te encerras, à livros
da última década, à litros das próximas
letras de vidas em breve
amarelas, porém eternas? O papel
é que desgasta. Encerra-te, assim, ao
morrer no verniz da última
página. Por quem o púrpuro
é prata? Sobre nós a teia desaba,
a geleira sem neve
desgasta, a falta de sentido e de lúcidos,
e vosso ronco
embala teu sono.
Avisa-me a vida, vida.
Se gritas estendida,
se vara nos carros
de todos os dias,
na rotina,
se és meu intelecto
ou minha experiência.
Se erro e te faço minha,
e a tua ausência
é evitar a tentativa
que é sempre certa.
A Tulipa vive por aqueles
que lhe acreditam bela.
Capítulo 3 (Amor)
AMOR ABSOLUTO
Eu poderia, na ternura da vida,
a renúncia dos nomes, amá-lo,
sabendo-te apenas homem,
se te entendesse família.
Se te fosse irmão.
Seremos, se no mundo tivermos
a moradia.
E temos.
Chega um dia, absoluto,
em que um corpo
são todos,
um abraço, muitos,
e cada único,
idêntico em irmandade.
Chega-nos um clarão,
esse dia,
que cega nosso discernimento.
O raro é conceito, à cada boca fresca que o fala.
O amor é julgamento, à cada peito ardendo a sua faca.
Os milhares de pensamentos cobrem agora cada
simples nó nas gargantas.
Nós em todos.
E as respostas, pessoais,
engasgam a saliva, na corda engolida,
subindo a língua de todo homem,
mentida em palavras, vagas,
voltando em fomes.
O branco é o preto, o rubro, o lilás.
Um final dos sexos, a fêmea é clarão,
o macho é clarão, vemo-nos cegos.
Tardes.
À tempo.
Braços
idênticos.
Idênticos, os ossos,
os membros nós temos.
Temos também paixão,
como quem teme.
Olhares
são do tempo, cavidades.
E relevos.
E tudo mais dos homens,
monumentos.
Olhos que lacrimejam
se permanecem abertos.
E de piscos em piscos,
nossos olhares caminham.
Jovens, ao intelecto.
Crescidos, ao espírito.
E se tiro a blusa na chuva,
é por ela, molhada, não por minha secura,
a loucura.
É pelo mundo meu livro,
não por ter-me despido, a poesia.
O amém dos nossos pedidos,
é a vida, mas a vida por propósitos
maiores que ela. As dúvidas
respondidas, sem fome nas línguas.
Poderias amar a mim,
se me entendesse como a si:
de carnes e almas um rebento,
se por eles liberto.
De dualidades.
Sob o olhar de asa,
o longe nos esmaga semelhantes.
Eu poderia, na tortura da vida,
te acolher irmão, amá-lo sob o clarão,
como alguém afundando no mesmo barco,
amá-lo, com o tremor das vontades
e a doçura da voz.
Não sei teu nome, sei-te homem,
braços e paixões.
10.10
ResponderExcluirChego ao hospital.
10.30
Chamam meu nome junto á porta do departamento de oncologia. Sei o que vou fazer, ainda assim, sinto um certo desconforto, um quase medo
11.00
A biopsia foi feita e eu quase nem senti. Mandam-me passar para outra sala. Está escuro. Enormes aparelhos enchem-na. Ajudam-me, explicam-me quando devo respirar ou não me mover. Minhas pernas tremem. Numa enorme tela de tv, vejo-me agora como nunca me vi – por dentro. Dentes, língua, traqueia, laringe.
!2.30
Liberto-me da sala escura, na rua a luz do sol é forte, estranho quanto o escuro me fez perder a noção do tempo. Há luz e sol por todo o lado.
14.00
Regresso ao gabinete do médico. Ele arruma papeis como se eu ali não estivesse. “E então?”
“Calma”, responde-me ele. O tempo dói-me então a passar.
14.20
Uma funcionária entra no gabinete com uma pequena pasta, ele abre-a e logo me diz “é benigno, mas temos que fazer a cirurgia para o remover”. Ele diz mais coisas, mas eu não escuto, não sou capaz.
15.40
Chego a casa. No jardim descalço-me e caminho pela grama, deito-me nela. Os cachorros correm a minha volta, latindo como sempre fazem quando chego.
!8.00
O telefone tem tocado. Ainda não atendi.
Seguro Morgana nas mãos nuas. (o mocho que eu crio desde bebe) ou melhor ela é que me segura, com suas enormes garras que me envolvem a mão. Encosto-a a mim e ela serena liberta um pouco a pressão das garras.
19.00
Acabo um artigo que estava quase pronto, mas prefiro manda-lo mais tarde.
23.30
Vou ao blog de Rodrigo. Há poemas novos lá. Copio-os. Enfim roubo-os, da mesma forma que roubo algumas fotos, para colocar na pasta “Rodrigo”. Um dia peço-lhe desculpa pelas coisas que lhe roubo sem ter intenção de devolver, essas pequenas grandes coisas que são pedaços dele, e que eu vejo, e que eu leio, as vezes que me apetecer.
Descobri hoje que o dia só faz sentido, se houver amanhã.
Continuo rouco, mas desta vez, feliz.