25.9.09

Prefácio

As linhas desse livro contém demasiado tempo. Historicamente, são auxílios do futuro; são conselheiros fiés do porvir; um farol magnífico na costa que ilumina e aporta frotas e frotas de previsões. A história dessas linhas começa há muito tempo presente, - uma pergunta: como se conjuga o tempo presente no passado, sem apelar para uma palavra rudimentar que evoca a morte? – quando um homem comum, provido de qualidades naturais da cultura de sua década, por direito sua, nada excepcionais, como a cobiça embrionária de seus desejos, a fisionomia marcada por um contato descuidado com as noites, a arritmia cardíaca, breves e pequenos amores, ímpeto de viagens – talvez o mais fundamentado em sua personalidade -, viaja à distâncias - ao encontro delas -. Viaja... um percurso no universo, na velocidade de uma luz – o que equivaleria, se à mim fosse permitido a especulação, há 500 anos.

Só conhece a distância quem a ela se entrega sem medição; pura em sua propriedade indefinida; sigilosa. Assim, alcança uma estrela morta. Sabe que a luz desta, que agora chega no planeta Terra, provém do passado, fazendo-a visível e, apesar de morta, íntegra à constelação. Ele agora repousava na luz do futuro da Terra, cansado da viagem. A luz da estrela atingia nesse momento a noite da Europa. De qualquer modo, não havia nada que ele pudesse chamar de futuro naquele corpo celéste vagando pelo espaço, pois como alguém seria um dia capaz de identificar no presente que vive - na vista que possui, num arrepio, na presença das coisas, na viva repercussão do ambiente que atinge sua audição, nos sentimentos - o futuro? E aqueles que ficaram na Terra e vêem uma luz pré-histórica da estrela que ele agora habita, como poderiam compreender vislumbrar o passado? Talvez, numa hipótese indecente, porém passível de verdade, o presente sejam dois elementos: o passado e o futuro, capaz de iluminar cada um de nós de forma completamente diferente. Somos todos referenciais, se observadores extraordinários, e pontos de relatividade do tempo.

Um comentário:

  1. Demoro a voltar
    Depressa chega o bom sentido de poder voar com as palavras com que escrevo este conto. É tão fácil esconder-me na irrealidade, o lugar onde consigo ser melhor. Quando caminho na cidade, subo e desço ruas de mãos ocupadas nos bolsos e olhar atinado no chão, não me canso de andar mas do fervilhar de pensamentos que colorem o meu dia. E dia após dia, assim teria a vida mais perto da perfeição. Esse jogo melódico de cores que parecem ter sons e essa harmonia cromática que lembram vozes. Repentinamente recuperam-me para a rua, a verdadeira, que não é fragrante como os meus segredos. São eles quem vive no meu pensamento, crescem em húmus de silêncio e imaginação, onde enraízam na memória de tudo de bom que eu vivi e que insisto manter. Volto a desprender-me e parto longe inspirado no perfume intenso de flores imarcescíveis. Não existem. Tão pouco eu quero existir nesse mundo onde elas são inexistentes. É ali que eu pertenço.

    in "Contos da minha rua" de Pedro Moita, Jay Jay para os amigos

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